Ao Arthur Rimbaud
enclausurado
em vinte metros quadrados,
tendo a única janela da casa vista
para o nada infinito e infernal,
para o nada infinito e infernal,
comunico-me com os mortos
para me sentir mais vivo.
rimbaud tem sido meu melhor amigo.
alimento-me de tua maldição e alma inquieta,
tua perna amputada pouco antes da morte,
tua perna amputada pouco antes da morte,
teus maus poemas escritos com sangue,
teus comércios assinados com bala.
viajo ao inferno ao teu lado
para retornar a esse mundo
e concluir que o verdadeiro inferno
não passa de mais um dia comum.
não passa de mais um dia comum.
o espelho revela minhas costelas tortas,
meus cabelos oleosos, minha barba malfeita,
minhas manchas de sol impregnadas no rosto,
meus olhos míopes que não enxergam o caminho,
minhas marcas de cirurgia de vesícula biliar,
meus braços finos e meus joelhos gastos.
sendo avesso, não posso esperar que
poemas que escrevo alcancem o futuro.
morrem em mim, palavras e rimas,
delírios sem álcool percorrendo veias
que tão claramente saltam da pele clara
enquanto a alma escura emudece.
afogo minha mente no travesseiro.
as paredes não me sufocam mais do que
o reverberar dos pensamentos.