31.7.15

POEMA INFERNAL

Ao Arthur Rimbaud

     enclausurado
em vinte metros quadrados,
   tendo a única janela da casa vista
para o nada infinito e infernal,
           comunico-me com os mortos
    para me sentir mais vivo.

rimbaud tem sido meu melhor amigo.
alimento-me de tua maldição e alma inquieta,
          tua perna amputada pouco antes da morte,
  teus maus poemas escritos com sangue,
                teus comércios assinados com bala.

viajo ao inferno ao teu lado
        para retornar a esse mundo
e concluir que o verdadeiro inferno
não passa de mais um dia comum.

o espelho revela minhas costelas tortas,
       meus cabelos oleosos, minha barba malfeita,
minhas manchas de sol impregnadas no rosto,
meus olhos míopes que não enxergam o caminho,
    minhas marcas de cirurgia de vesícula biliar,
               meus braços finos e meus joelhos gastos.

sendo avesso, não posso esperar que
     poemas que escrevo alcancem o futuro.

morrem em mim, palavras e rimas,
         delírios sem álcool percorrendo veias
que tão claramente saltam da pele clara
    enquanto a alma escura emudece.

afogo minha mente no travesseiro.
as paredes não me sufocam mais do que
                   o reverberar dos pensamentos.