o dia é de corpus christ,
mas para meu vizinho de parede
a celebração dos corpos possui outras
conotações menos religiosas.
a mim, sem a
possibilidade do gozo
por outros meios que não o mais solitário,
resta a poesia que
derrama em meu corpo
oriunda do teto branco
recém-pintado.
moedas acumulam
na estante,
tornam minha casa mais pesada,
mas o tilintar dos cobres me agoniza mais
do
que o peso de qualquer coisa sobre
os ombros acostumados ao
mundo.
tendo pernas para andar
e a sabedoria de seus
valores
ao finalmente conhecer poliana,
caminho pela rua são
paulo
em busca dos
fragmentos finais
do poema que clama pelo
seu
habeas corpus.
um tijolo de construção
e um desenho de peixe na calçada
anuncia que ali
passou a poesia.
ao peixe desenhado em
laranja dei
o nome de alfa, o primeiro, o princípio,
o mais
brilhante entre todos eles.
se muitos esperam
seu ômega,
o final, o término, o que se apaga,
espero a chuva não para
levar o peixe
embora em cada uma de suas gotas,
mas sim
para que com a água
possa finalmente
respirar e agarrar
a vida como jamais
pensou em fazê-lo.
ao alfa, resta a esperança do espelho:
inversa à
realidade que nos afoga.