18.8.15

POEMA ALFA


o dia é de corpus christ,
mas para meu vizinho de parede
a celebração dos corpos possui outras
                     conotações menos religiosas.
   a mim, sem a possibilidade do gozo
por outros meios que não o mais solitário,
         resta a poesia que derrama em meu corpo
  oriunda do teto branco recém-pintado.

           moedas acumulam na estante,
tornam minha casa mais pesada,
mas o tilintar dos cobres me agoniza mais
            do que o peso de qualquer coisa sobre
   os ombros acostumados ao mundo.

tendo pernas para andar
          e a sabedoria de seus valores
ao finalmente conhecer poliana,
   caminho pela rua são paulo
          em busca dos fragmentos finais
   do poema que clama pelo
                     seu habeas corpus.

um tijolo de construção
e um desenho de peixe na calçada
             anuncia que ali passou a poesia.
  ao peixe desenhado em laranja dei
o nome de alfa, o primeiro, o princípio,
               o mais brilhante entre todos eles.

           se muitos esperam seu ômega,
o final, o término, o que se apaga,
     espero a chuva não para levar o peixe
embora em cada uma de suas gotas,
                  mas sim para que com a água
    possa finalmente respirar e agarrar
          a vida como jamais pensou em fazê-lo.

ao alfa, resta a esperança do espelho:
             inversa à realidade que nos afoga.