25.9.15

POEMA AUSENTE


a criança que ri no retrato
já não é mais riso, não é mais infante.
é triste, hoje, a criança que ri no retrato.

traz no âmago o amargo da vida.
o contrário do que seria teu nome.
o avesso do que desejaram teus pais
ao conceberem o menino amado.

caminha
de punhos cerrados
sobre o chão onde
restam sonhos perdidos.

são poucos, raros,
sonhos que se transformam
               em flor quando derramados.

na jardineira do poeta,
repousa a hortelã para o chá da tarde.

nada de orquídeas, margaridas, violetas.
nada que faça brotar o riso que
a criança cultivava no retrato.

algum dia houve felicidade genuína?

o poeta pergunta a si mesmo,
pois a ele não foi dada a dádiva
- antes ofertada ao pequeno príncipe -
de ter uma rosa com quem pudesse contar.

POEMA PORTUGUÊS

Ao Fernando Pessoa

a fumaça de meu capuccino
confunde-se com a fumaça do
charuto de álvaro de campos.

sei que blefa quando
traga mais do que o costume,
ajeita o monóculo e resmunga
qualquer coisa em inglês.

deposito minhas fichas
em uma trinca de valetes,
sabendo que álvaro não tem
nada de esperançoso em mãos.

à minha frente,
os olhos azuis de alberto caeiro
parecem vagar por outro mundo onde
a verdade do pôquer é inexistente.

sabe resguardar as cartas como ninguém
o sábio guardador de rebanhos.

ricardo reis joga as fichas na mesa
como se não houvesse amanhã,
dobrando minha aposta.

álvaro liberta-se,
alberto deixa a mesa,
ricardo parece confiante.

cubro a aposta e desço a trinca.
reis apresenta o majestoso flush.

em lapso de desassossego,
bernardo soares, que não havia entrado
na história, leva tudo com o full house.